O projecto compreende também um percurso de encontros pedagógicos para diferentes públicos, a partir das três temáticas abordadas, e a realização de um Doutoramento em Estudos de Teatro na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com a orientação da Professora Doutora Anabela Mendes.
A produção é da estrutura Ritual de Domingo – Associação Artística com coprodução do Teatro Viriato, em Viseu.
“Os Irmãos Karamázov”, partindo de uma das questões basilares do pensamento filosófico e espiritual - o Parricídio, propõe três pontos de vista muito distintos, embora interligados, sobre a vida e o mundo, personificados pelos três irmãos: Ivan, Dmitri e Aleksei. Estas três perspectivas, que designámos por Ivan ou Dúvida, Dmitri ou o Pecado e Aleksei ou a Fé, (assumindo o nosso contexto histórico e cultural de raiz judaico-cristã), continuam a representar nos dias de hoje motores de questionamento e de procura para o espírito humano e a sua relação com tudo o que o rodeia.
Esta representação dos três irmãos permite-nos abordar a obra a partir de um determinado posicionamento filosófico, o que acabará por ser condição fundamental na criação dos três espectáculos teatrais:
#1
A Dúvida
enquanto fruto da necessidade de questionar, explicar, racionalizar, inerente ao ser humano.
#2
O Pecado
enquanto aceitação dos instintos mais irracionais, selvagens e potencialmente destruidores no ser humano.
#3
A Fé
enquanto capacidade de escutar, acolher, confiar, acreditar; colocando-se ao serviço de algo que nos ultrapassa e que se projecta na ideia de futuro colectivo.
Partindo da ideia de que todo o homem é senhor de si mesmo, fruto das suas escolhas e consciência, Ivan Karamázov coloca-se acima da ideia de bem e de mal. Mas desta sua concepção do mundo nasce a semente do crime mais hediondo: o parricídio. Será ele capaz de viver com as próprias escolhas?
O espectáculo, cuja dramaturgia é muito próxima das palavras do autor russo, é construído a partir de uma relação entre a cena e os espectadores que joga com factores como a proximidade e a distância, a utilização não convencional de espaços e o inesperado. Mais do que num espaço físico, estamos num espaço mental, em que todos (intérpretes e espectadores) participam na batalha interior do protagonista.
Depois de 100 anos da Revolução Russa de 1917, reencontramos em Dostoiévski a semente para a profunda transformação social, cultural e política que marcou o início do século XX. Da Rússia para o Mundo as questões continuam universais: a existência de Deus e aquilo que fazemos em seu nome, a luta de classes, a consciência individual e colectiva, o princípio da liberdade.
Para além da apresentação do espectáculo, existe também a possibilidade da organização de um Workshop cujo propósito é a pesquisa e criação teatral a partir da obra. Os formandos poderão, eles próprios, realizar a análise de excertos da obra e experimentar a sua recriação teatral.
Dmitri, o primeiro filho: passional, sensual, irascível, violento. Aquele que abertamente anuncia o seu desejo de matar o pai - será ele o parricida? Dmitri representa a ideia de pecado, porque não consegue (ou não quer) resistir aos impulsos violentos e destruidores que constantemente o assaltam.
Depois da primeira fase em que nos debatemos com a Dúvida de Ivan, e com a impossibilidade de escape perante esse radicalismo analítico; afrontaremos agora a via do delírio e do desejo. E também aqui nos vemos diante de um abismo: o do desejo descontrolado, o dos impulsos mais selvagens, o da entrega ao lado mais irracional e sensual da natureza humana. Debruçamo-nos sobre a viagem de Dmitri ao longo do romance, em particular os dias anteriores à noite do crime (o assassinato do pai), a noite do próprio crime e as consequências dessa noite. Dostoiévski conduz-nos lado a lado com Dmitri através dessas horas delirantes, exacerbadas, loucas.
E se em Ivan ou a Dúvida trabalhámos sobre a angústia do combate solitário e mortal entre um homem e a sua própria consciência, em Dmitri ou o Pecado serão o frenesim, o delírio, o arrebatamento e a passionalidade os motes que guiarão este processo. Uma outra faceta na obra de Dostoiévski, profundamente humana, retratada com a ampliação microscópica que lhe é habitual.
Aliocha representa o amor que tudo perdoa, associado à figura de Nossa Senhora na ortodoxia russa. O seu carácter e comportamento não são explicados de modo psicológico, dando a entender que há alguma inspiração nele talvez de tipo sobrenatural, como a que caracteriza os homens santos: “a pureza moral da sua natureza e o amor que inspira em todos, (…) são atributos tradicionais dos santos”.
Esta religiosidade natural de Aliocha, esta fé incondicional, não o afasta porém das questões políticas e sociais do seu tempo – ele é descrito pelo autor como “um jovem dos nossos tempos modernos, ou seja, honesto por natureza, que exigia a verdade, que a procurava e tinha fé nela(…)”
A questão da fé torna-se o núcleo duro impossível de contornar. A fé, como a entendemos em Dostoiévski, e também na nossa visão, não se pode reduzir apenas ao tema da religião. O próprio Dostoiévski sabia que a questão não se resolvia dessa forma e por isso dizia que até ao fim dos seus dias a luta interior entre a dúvida e a fé iria continuar.
A oficina inclui-se no Projecto KARAMÁZOV de Sónia Barbosa, cujo propósito é a pesquisa e criação teatral a partir da obra literária “Os Irmãos Karamazov” de Fiódor Dostoiévski. KARAMÁZOV é pensado para um período mínimo de realização de 4 anos, com o objectivo de, através duma profunda pesquisa, investigação e experimentação, envolvendo diversos artistas e estruturas, chegar a três espectáculos teatrais: "Ivan ou a Dúvida", "Dmitri ou o Pecado" e "Aleksei ou a Fé". O projecto compreende também encontros pedagógicos para diferentes públicos, e a realização de um Doutoramento em Estudos de Teatro na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
A obra “Os irmãos Karamazov”, partindo duma questão fundamental do pensamento filosófico e espiritual - o Parricídio - propõe também três pontos de vista sobre a vida e o mundo (personificados pelos três irmãos, Ivan, Dmitri e Aleksei) que continuam a representar zonas de angústia, de questionamento e de procura para o espírito humano: a dúvida, a fé e o pecado. A dúvida (Ivan) enquanto fruto da racionalidade analítica do ser humano; o pecado (Dmitri) enquanto incapacidade de resistir aos impulsos muitas vezes destruidores que nos assaltam; e a fé (Aleksei) enquanto capacidade de entrega total perante algo desconhecido.
Nestas oficinas, pensadas para cada um dos 3 espectáculos da Trilogia (“Ivan ou a Dúvida”, “Dmitri ou o Pecado” e “Aleksei ou a Fé”), serão abordados excertos da obra literária, propondo o percurso criativo que começa no texto escrito e acaba numa cena teatral, segundo as metodologias usadas no processo criativo de Sónia Barbosa. Este processo inclui exercícios da prática teatral (corpo, voz, dinâmicas, etc.), trabalho de improvisação, análise de texto, e propostas específicas de construção de cenas teatrais.
As linhas de pensamento que guiam o nosso trabalho são:
— Questões filosóficas e de pensamento “dostoiveskiano” à luz da contemporaneidade
— Teatralidade das personagens e das situações
— Transposição da linguagem literária para linguagem cénica
— Associação de materiais diversos tendo a obra literária "Os Irmãos Karamazov" como referência central
— Criação de objetos teatrais, partindo da ideia de transversalidade entre várias áreas: literatura, escrita dramática, escrita cénica, pensamento filosófico, improvisação, sobreposição de materiais de diferentes qualidades, etc.
— A relação pessoal e subjetiva com a obra, através do contacto com os outros e do contacto com a própria memória e vivência.
Esta conversa/conferência pode ser organizada em articulação com a apresentação dos espectáculos da trilogia Karamázov.
A encenadora Sónia Barbosa convida-nos a ocupar o espaço cénico da peça apresentada, em modo de conversa, tendo como ponto de partida o “Projeto Karamázov”. Um projeto de pesquisa e criação teatral desenvolvido a partir da obra literária “Os Irmãos Karamázov”, de Fiódor Dostoiévski, que surge no âmbito da tese de doutoramento da artista em Estudos de Teatro e que deu origem a três peças de teatro e diversas oficinas.
Entre os convidados desta sessão, para além de Sónia Barbosa, contamos com a presença de Anabela Mendes, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, cuja atividade científica e ensaística se desenvolve em diversas áreas relacionadas com a arte e a dramaturgia, tendo também desenvolvido trabalho como dramaturga, autora de peças, assistente de encenação e encenadora. E outro(s) convidado(s) a definir.